Ciduca Barros
Todos que viveram aqueles anos de chumbo sabem que foram dias duros e nebulosos.
Quem não os viveu, já leu o que largamente já se falou ou se escreveu sobre o assunto: o Golpe Militar de 64, movimentos clandestinos, prisões em massa, terrorismo da esquerda, porões escuros da direita, desrespeito aos direitos individuais, Congresso Nacional fechado, governantes biônicos, um verdadeiro inferno.
O Ato Institucional nº 5 (o famoso AI-5), baixado em 13.12.1968, pelo governo Costa e Silva, dava poderes ao Governo Federal para cassar políticos.
O Governo Federal, respaldado pelo AI-5, que ele mesmo criou, mandou o pau num monte de políticos, cassando os seus mandatos e suspendendo os seus direitos políticos.
A imprensa da época divulgava largamente as cassações e os nomes dos seus respectivos cassados.
Não se falava noutra coisa nas rádios e jornais (no nosso Interior ainda não tínhamos televisão):
– Cassado o mandato do Senador Fulano de Tal!
– O Governo Federal cassou o mandato do Deputado Beltrano de Tal!
– Parece que o Governador Sicrano de Tal será cassado!
De tanto ouvir aquilo, a empregada doméstica de um amigo caicoense, médico na cidade de Currais Novos (RN), certo dia, chegou pra ele e perguntou:
– Doutor Geraldo, por que agora vivem “caçando” (do verbo caçar mesmo) os políticos?
O amigo, naturalmente, procurou as palavras mais acessíveis para explicar àquela pessoa humilde o porquê de tanta cassação.
Concluída a explicação, demonstrando que entendeu perfeitamente, ela desfechou outra pergunta, justificando o uso do verbo “caçar”:
– Eles tão “caçando” com quê? De espingarda ou de forje*?
*Forje, ou forja, no nosso vasto sertão, é o nome que se dá à armadilha própria para apanhar caça.
Escritor e colaborador do Bar de Ferreirinha
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