Hoje, o comendador Stoessel Dias, Xexéu como é mais conhecido no mundo etílico-gastronômico-cultural de Caicó, está completando 90 anos de idade.
A cidade foi despertada com uma alvorada musical tocada pela Banda de Música Recreio Caicoense.
E uma data tão especial, merece uma comemoração super especial: os filhos Paulo (de Recife), Lêda (de São Paulo) e Lenira (de Natal) viajaram a Caicó pra festa de Xexéu.
Também estão na cidade Luzardo Cebolinha, neto que inscreveu para sempre o Bar de Xexeu nos anais de Natal, demais netos e bisnetos, amigos mil para este encontro especial com O Mito da boemia de Caicó.
O Bar de Ferreirinha pede licença aos familiares pra se juntar nas homenagens ao querido Xexeu, amigo e compadre de Clóvis Pereira de Araújo, in memoriam, pai dos editores (ir)responsáveis deste blogue, Roberto e Pituleira.
Nossa homenagem especial a este homem que vive cercado de amigos, foi agraciado pela Câmara Municipal de Caicó no dia 18 de julho de 2014 com a Comenda Vila do Príncipe e tem a graça de hoje estar completando 90 anos de idade.
Viva Xexeu!
O Bar de Ferreirinha, em homenagem ao aniversariante, familiares e amigos, publica texto escrito por Roberto Fontes e publicado na extinta revista O Botequeiro, que era dedicada aos boêmios e bares do Rio Grande do Norte, na edição de novembro de 2011.
Xexéu, o mito
Roberto FontesJornalista, cachaceiro, editor do blogue Bar de Ferreirinha
Xexéu, o mito da boemia de Caicó e arredores |
Stoessel Dias, casado com Guilhermina (in memoriam), pai de Tecobol (in memoriam), Paulo Dias, Lêda e Lenira, é uma figura ímpar, que só poderia ter nascido em Caicó. Sim, Stoessel é só no registro civil: ele é conhecido mesmo pelo apelido de Xexéu. Apreciador de cerveja gelada, Xexéu adora viajar - normalmente no banco da frente do carro, com o cotovelo apoiado na porta - e faz o percurso ficar menor com a sua inacreditável capacidade de contar estórias. É servidor público aposentado e frasista emérito.
“Eu não tenho formação acadêmica nenhuma, especialmente em engenharia química, mas uma das coisas de que eu mais gosto de fazer é transformar cerveja, cachaça e outras bebidas alcoólicas em urina!”. Aos 84 anos de idade, completados no dia 30 de setembro de 2011, Xexéu continua irreverente, gozador, cachaceiro, cervejeiro, botequeiro, jogador de baralho e mulherengo – um boêmio na mais completa acepção da palavra. Sempre foi assim, desde o início de suas atividades há mais de 60 anos.
É um dos clientes-fundadores ainda em atividade do Bar de Ferreirinha, o boteco mais antigo no Rio Grande do Norte, que funciona desde 1959. Entre uma cerveja gelada e um prato de rapa de queijo de manteiga, cercado por vários bêbados atentos às suas frases recheadas de bom humor, Xexéu exercita diariamente o seu jeito bonachão. “Meia idade é a altura da vida em que o trabalho já não dá prazer e o prazer começa a dar trabalho”, costuma dizer aos companheiros de bar, que adoram as suas tiradas.
O espírito boêmio sempre falou mais alto, principalmente no tempo em que ele mantinha o Bar de Xexéu, no Mercado Público, que ficou conhecido em todo o Rio Grande do Norte pela excelência da carne de sol que só ele sabia preparar.
Era comum, em pleno movimento do fim de tarde, algum amigo convidá-lo pra uma farra e ele, simplesmente, deixar a chave do bar pendurada na fechadura com a recomendação expressa: “o último a sair feche a porta e guarde a chave pra me entregar amanhã ou noutro dia”.
E saía pelos inferninhos da cidade e dos arredores, vivendo a mil a sua aventura boêmia e de vadio profissional. Conta o amigo e radialista Clóvis Pereira Júnior, o Pituleira, também editor do blogue Bar de Ferreirinha e companheiro de farras, que Xexéu também gostava de contar umas mentiras sinceras. “Pra impressionar, ele dizia que era filho de pais ricos, afilhado do saudoso senador Dinarte Mariz e um ex-acadêmico de Medicina que vivia como boêmio apenas porque preferia levar uma vida mais agitada e emocionante”, diz Pituleira.
Jogo do Bicho - Um fato impressionante marcou a vida de Xexéu como banqueiro do Jogo do Bicho, na década de 1950. Uma jogadora inveterada, dona de casa aposentada de Jucurutu, sonhou que o bicho seria vaca durante seis sextas-feiras consecutivas. Não só sonhou, mas avisou à vizinhança, aos familiares e aos amigos e, na sexta-feira seguinte, foi a Caicó jogar no bicho. Jogou em vaca e o bicho foi... vaca!
A notícia se espalhou rapidamente. Na sexta-feira seguinte, o movimento na banca de Xexéu duplicou: todo mundo jogou vaca. Deu de novo, e assim foi durante mais três semanas. Na sexta semana consecutiva, caravanas de apostadores de todas as cidades do Seridó se dirigiram a Caicó para jogar no bicho. Em vaca, evidentemente! Xexéu recolheu o dinheiro das apostas, alugou o jeep de Otoni Nóbrega - único carro de frete disponível na época - e foi descarregar as apostas de sua banca com um bicheiro de Campina Grande, a 204 quilômetros de Caicó, pensando, evidentemente, em ganhar muito dinheiro.
O bicho foi... cavalo! Aí Xexéu quebrou.
Uma vez boêmio, sempre boêmio. Ainda hoje, aos 84 anos de idade, Xexéu cumpre o ritual de beber uma cervejinha ou uma cachacinha antes do almoço. Recentemente perdeu a mulher, Guilhermina. Mas não perdeu a verve: ‘Quando a gente envelhece, o cabelo embranquece, o osso adoece, o joelho endurece, a vista escurece, a memória esquece, a gengiva aparece, a hemorróida engrandece, a barriga cresce, a pelanca desce, o pau amolece, a mulher se oferece e a gente agradece’. Vida longa a Xexéu Dias!
Estórias e histórias
O Bar de Ferreirinha, blogue que também é o espaço boêmio dos bêbados de Caicó, publicou várias estórias em que Xexéu Dias foi protagonista. Algumas seguem abaixo:
Homem feliz
Xexéu passou maus momentos com um pico de pressão alta.
Precisou, inclusive, de atendimento cardiológico porque o tensiômetro marcou estratosféricos 20 X 14, valor perigosíssimo para um boêmio oitentão.
Aliviado, ele comentava numa roda de amigos que a pressão voltou ao normal, que a dor de cabeça sumiu e que a velha rotina de pif-paf, cerveja, lero e jogos de azar em geral estava de volta.
Benedito Santos (in memoriam), amigo, gozador emérito, comentou sobre o inconveniente:
- Xexéu, considere-se um homem feliz: pelo menos você ainda tem alguma coisa que sobe...
Azar no pif-paf
Xexéu chegou em casa murcho, com o rabo entre as pernas.
- O que foi que aconteceu? - pergunta Guilhermina, sua mulher.
- Perdi todo o meu dinheiro no pif-paf!
Guilhermina fica uma fera:
- Também, pudera! Você é um imbecil! Não sabe que dá azar jogar em plena sexta-feira santa?
- E os putos que ganharam meu dinheiro? Por acaso estavam jogando num sábado de carnaval?
Olho no olho (contada por Orlando Caboré Rodrigues)
Uma senhora entra no bar e surpreende Xexéu retirando uma manta de carne de sol de uma sacola e, de imediato, pondo no fogo para assá-la.
A intrusa:
- Vixe, que sujeira! O senhor sequer lavou a carne!
Xexeu, rápido no gatilho, devolve a ofensa:
- A senhora já comprou pão lavado?
Em outra ocasião, Xexéu assava queijo de coalho.
O coronel Benedito Queiroz (in memoriam), da Polícia Militar, freguês assíduo, arrisca:
- Só compro o queijo depois de experimentá-lo…
A resposta de Xexéu:
- Benedito, você também come uma fatia quando vai comprar sabão?