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terça-feira, 5 de abril de 2022

Olhando para o lado

             

Ivar Hartmann

Conto bem como foi. Parei no sinal fechado aguardando o verde. Tinha um carro vermelho estacionado no cordão da calçada e me chamou a atenção. Era uma Ferrari. Sim, destas Ferrari que são o sonho de consumo de ao menos cinco entre dez homens. Bem que eu gostaria de ter o prazer de dirigir uma. Lá estava ela. Vermelha com suas linhas diferentes e que tanto barulho faz na F-1, que assistimos. E depois, voltando os olhos para a frente e para o sinal ainda fechado, fiquei matutando que era um carro lindo que eu jamais dirigiria, a não ser locando na Europa e, ainda assim, uma extravagância acima do meu bolso. Sinal ainda fechado olhei para a esquerda para ver o carro ao meu lado. Era uma camionete Fiat que já viveu melhores dias. Meio suja, velha, carregando uns sacos de cimento e uma betoneira atrás. Na frente dois homens vestidos como operários de obra.

Do céu ao inferno terreno em um instante. Eu no meu carro, que longe de ser uma Ferrari, não era o Fiat, de certo do século passado. Neste instante, neste pequeno intervalo do semáforo, neste cruzamento de uma avenida movimentada, correram os extremos. O do carro de luxo que não posso ter e o do carro velho que não preciso ter. E assim é, ao final, nossa vida. Não alcançamos tudo que queríamos, mas, certamente, na maioria dos casos, mais do que esperávamos. Saúde, família, estudo, amizades, conforto. Tanta coisa a agradecer a Deus ou ao destino. Ao trabalho ou ao acaso. Tanto ainda possível de fazer, mas tanto já feito. Esperanças que nascem e morrem e dão lugar a novas esperanças. Nossa vida. No seu dia a dia. Se lembrarmos dos desvalidos, dos cadeirantes, dos doentes, dos mortos estupidamente, quão felizes somos com o que temos. É só valorizarmos. 


Promotor de Justiça aposentado

ivar4hartmann@gmail.com

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