Seridó das tradições populares e da Festa de Sant'Ana |
Seridó
Melhor do que o mar
Melhor que as praias distantes
Melhor do que as estiagens permanentes
O Seridó só perde para as poesias escritas nas pedras rupestres
O Seridó é mais aprazível que as parábolas dos hebreus
As feiras estão esquecendo seus cordéis
As cantorias dos alpendres estão dormindo
As cercas de pedras sumindo
A desertificação está invadindo o juremal
A violência assassina o encanto
Mas
O Seridó continua grande
Ouro Branco onde Orilo Dantas fazia versos para defender as oiticicas
Aos sábados
Declamava nas feiras de Caicó
Durante a feira
Repentistas
Emboladores
O homem da cobra
Vendendo pomada que curava as dores
E os embriagados
Cantavam Waldick Soriano
A Serra da Rajada é mais sagrada do que o Monte de Sião
As cordilheiras andinas têm confinamento de frio
Mulungu
Samanau
O sertão
A luz do sol
Íris era a moça mais bonita das ribeiras
Torrão trabalhava com o pai dela
Torrão espreitava Iris todos os dias
A garotada jogava bola nas areia do rio
Depois
Fazia cacimbas
Na própria areia
Para afugentar a sede
Na Rádio Rural
Elino Julião cantava:
“Eu não quero pagamento
Nascimento...”
Mas o Seridó é grande
E o rei era Luiz Gonzaga
Elino não reclamava
Caboré sempre dizia
Que as calçadas do Seridó
Eram melhores do que as de Paris
O carnaval com Ala Ursa
O papangu corria atrás das crianças
Pra pegar
De mentirinha
As ruas lotadas de foliões
Me preocupava as invasões das alegrias descartáveis
Nos sons eletrônicos
As chuvas anunciavam a chegada do inverno
Todos recebiam o inverno com lágrimas de contentamento
Quando o Itans sangrava o Barra Nova corria na direção de Jucurutu
Os agricultores
Plantando algodão mocó
Espalhando semente pela terra prometida
Todo ano
Judas era enfocado em plena praça
As fogueiras assando milho
Nas noites de São João
O Trio Nordestino
Fazendo forró de raiz
Forró com cheiro de povo
Festa de Santana...
O Parque Lima era o melhor carrossel da infância do mundo
Pertinho de Caicó ficava Timbaúba dos Batistas
Com suas festas reluzentes
Carnaúba dos Dantas tinha Felinto Lúcio
Com seus dobrados sacros
Acari reservava agosto
Para a procissão
Os vaqueiros tangiam o rebanho
Vestidos de gibões
Acalentavam o gado
Improvisando aboio
E nos espinhos da caatinga inóspita
Corriam
Com valentia
Para derrubar o touro mais bravio
Nas feiras
As ruas eram lotadas de feirantes
Uma senhora vendia filós com mel
Tinha vendedor de sequilhos
Os melhores sequilhos
De todos os cafés
Eram os sequilhos das feiras do Seridó
Quem nasce no Seridó
Sabe conversar
Sabe se sentar num tamborete
E passar a noite numa prosa
Respeitando as estrelas
Nas conversas
Sempre tinha alguém
Debulhando feijão
O Seridó tinha a melhor prosa da noite
Carne de sol
Servida com farofa d’água
Vixe!
Emídio Mucica
Grande mágico
Nos circos
Da capital carioca
Lá
Ele era conhecido como “Mister Fred”
Queijo com goiabada
Na merenda
Ave-maria!
Quem não entendia do sabor da terra
Dizia que o seridoense era barrista
Cabra besta...
Não sabia
O infeliz
O significado do amor!
Padre Miguel me confidenciou
Que gostaria de ser seridoense
Pra falar da terra com orgulho
Seridó
Os versos de José Lucas
As canções de Sebastião Dias
Nos dez de galope
O Seridó abraçando as pessoas
Liverpool vestido de algodão mocó
Tomar café nas cozinhas dos sítios
Era a coisa mais deliciosa das tardes
Quero voltar
Escutar Torrão falando das moças bonitas
Dos costumes dos judeus
Dos feirantes
Dos açudes sangrando
Da grandeza da terra
Nas prosas do Seridó.
Escritor, poeta e colaborador do Bar de Ferreirinha
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