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quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

Diarreias mentais - CLXXXII


Um golpe de mestre

Esta história ocorreu no tempo em que as transações comerciais eram realizadas com dinheiro vivo ou cheque, e ainda não havia chegado o dinheiro de plástico – o cartão de crédito.
Às 18h de uma sexta-feira, um casal, braços dados, entrou numa milionária joalheria de uma grande cidade. 
Ele era feio e desengonçado, modestamente vestido e aparentava um falso prestígio. 
Ela era jovem e bonita, uma loura com um corpo escultural e demonstrava certo constrangimento.
– Gostaríamos de ser atendidos pelo gerente da loja – disse, boçalmente, o cidadão à vendedora que tentou atendê-los.
Convocado o gerente, ele ouviu do sujeito a seguinte proposta, com uma voz falsamente impostada e apontando para a sua linda acompanhante: 
– Esta dama vai escolher umas joias e ela já está sabendo que não existem limitações de quantidade nem de valor. Por favor, mostre-lhe as peças de ouro e as pedrarias mais valiosas do seu estoque.
O gerente, analisando aquele sujeito que não lhe transmitia nenhuma confiança, pensou com os seus botões: “me lasquei, isto está me cheirando a golpe”. 
Discretamente, se acercou de medidas de segurança, mas fez o jogo do homem. 
Abriu o cofre e mostrou as mais ricas peças do estabelecimento: anéis, colares, tiaras, brincos, broches, etc. A jovem despiu-se do seu acanhamento e mandou brasa. Escolheu uma porrada de coisas que, somados os valores, deu uma alta soma de dinheiro.
O assustado gerente, ainda ressabiado, viu quando o cara tirou do bolso um talonário de cheques do Banco do Brasil, daquela famosa conta “Depósitos Populares” (daqueles cheques vermelhos apelidados de “goiabão”), e preenchendo um deles com o valor da compra, sem pedir nem desconto, fez o seguinte discurso:
– Nós não vamos levar nada agora. Na próxima semana, logicamente após a compensação do cheque, o meu amorzinho aqui virá apanhá-las.
O nervoso gerente suspirou aliviado e pensou: “graças a Deus. Não tem errada, o cheque vai voltar, mas as joias estarão no nosso cofre”.  
Naturalmente, fechou o negócio, recebeu o cheque-goiaba e o casal saiu. 
Ele andando imponentemente e ela, elegante como entrou, agora esboçava um leve sorriso no seu belo rosto.
Na semana seguinte não deu outra: a conta do pernóstico sem nenhum centavo, o cheque voltou como “sem fundos”.  
O gerente, mesmo sem demonstrar surpresa pela devolução do borrachudo, mas ainda sem entender porra nenhuma, resolveu ligar para o indivíduo para tirar o seu sarro:
– Escute, cara! A merda do seu cheque voltou!
– Eu sabia – respondeu naturalmente o boçal.
– E agora? – perguntou o gerente da loja.
– Agora, você tenha cuidado pra não entregar as joias àquela dona – disse o cara-de-pau.
E acrescentou, dando uma sonora gargalhada:
– Você não faz ideia do fim-de-semana maravilhoso que eu passei com aquela gostosura.
O golpe era na gostosona e não na joalheria. 

Ciduca Barros é escritor e colaborador do Bar de Ferreirinha

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