Alisando Cresci
A pior característica dos estúpidos é a certeza de que o resto do mundo vive na estupidez. Há ainda uma casta mais estúpida na espécie dos estúpidos: os estúpidos burros – nenhuma associação com a nobre espécie dos asnos. O pior é que a estupidez não tem monopólio.
Lula e Bolsonaro são estúpidos e muito parecidos. Embora seus seguidores dogmáticos digam o contrário com uma idolatria constrangedora – e obviamente estúpida –, não passam de dois sujeitos ignorantes, incompetentes, fanfarrões, misóginos, homofóbicos, racistas, corruptos, indignos da Presidência da República.
Estão por aí há mais de 50 anos sem qualquer relevância, mas hoje dominam a política brasileira pilotando uma polarização dolorosa para os destinos nacionais. Na verdade, disputam palmo a palmo o campeonato de vexames sempre caríssimos para o bolso do contribuinte. Não é tarefa difícil, dada a estupidez coletiva de uma sociedade que sempre se lixou para ela mesma.
Por muitos anos imaginamos que a representação brasileira do reino da burrice humana fosse feudo dos petralhas, naquela exuberância de gerar provas contra eles mesmos e na competência em colocar a corda nos próprios pescoços. Qual nada, desde 2017 emergiu das trevas do baixo clero uma família que roubou cetro e coroa dos adversários.
Como naquele momento a petralhada estava encarcerada na roubada bilionária do consórcio mensalão + petrolão, ocupar o território da outra facção ficou mais fácil para os emergentes da estupidez, que tomaram o centro do picadeiro e tornaram o espetáculo ainda mais dantesco. Tanto que a frase “É inacreditável a falta de adulto na sala!” se tornou uma espécie de tatuagem na testa da família Bolsonaro, um coletivo de estúpidos.
Foram quatro anos de aberrações ao lado de figuras inacreditáveis como aliadas. Até o coitado do Jesus entrou na dança: não bastasse a cruz milenar, foi colocado no pau da goiabeira! E as Forças Armadas, especialmente o Exército, causaram assombro com a quantidade de gente desqualificada que vestia farda e foi ocupar cargos civis no governo.
O tempo passou e a ópera-bufa teve seu desfecho com o país amanhecendo debaixo de memes com a prisão do líder da bananada. “Se o cara for preso, o país vai parar”, esbravejaram em várias ocasiões os babões mais próximos da cesta de ovos. Bela profecia, o país já estava parado pelo feriadão.
A eterna mania de brincar com a inteligência coletiva que permeia a política nacional parece ter dado chabu e jogado a pá de cal nessa figura sinistra.
A multidão que protestaria continuou na praia, na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapê trepada na serra. Ou num shopping, que ninguém é de ferro. Até porque a “prisão” foi mostrada: uma acomodação individual com 12 m², ar-condicionado, televisão, frigobar, janelas e banheiro exclusivo, com direito a equipe médica de plantão 24 horas. Quem vai perder um churrasco ou um cineminha por isso? Desde então as ruas estão cuidando somente do próprio cotidiano.
Inventar uma “vigília de orações” foi o cúmulo da estupidez, inclusive porque o alvo das preces nunca foi um modelo de religiosidade. Já a esposa, embalada como quase pastora, estava rezando a milhas e milhas dali, no Ceará – e provocando mais confusão, como convém à tatuagem na testa da família.
Tudo ia bem até que a tentativa de romper do hímen da tornozeleira eletrônica alertou a Justiça do estupro iminente das medidas cautelares em curso. O Instituto de Criminalística atestou que o equipamento continuou virgem, mas ficou comprovada a tentativa de abuso de inviolável.
Até o Inspetor Clouseau, famoso pela estupidez em A Pantera Cor-de-Rosa, foi um dos primeiros a perceber que a tentativa de rompimento do hímen da tornozeleira era uma cagada sem tamanho, que seria associada ao tumulto da hora do culto orar pelo Exército de Brancaleone.
Quando o plano ruiu e a prisão preventiva foi decretada, chegaram a inventar que o destrambelhado tinha batido com a tornozeleira numa escada – sem estabacar-se no chão, diga-se! Passo seguinte, um dos luminares da egrégia confraria sugeriu criar a narrativa de que o homem tinha surtado e violado a dita cuja, abrindo uma picada para a defesa alegar mais um problema de saúde, agora de cunho mental, em busca de atenuantes que mantivessem a prisão domiciliar. Os aliados cogitaram ressuscitar o projeto de anistia. O mais impressionante é que a versão do surto psicótico extrapolou o ambiente dos currais do rebanho e contaminou a tese da defesa, surpreendendo o mundo jurídico.
Tudo seguia o roteiro da balela, já que ninguém sabia direito como tinha sido a tal tentativa de violação da tornozeleira. Até que surgiram na imprensa as imagens deprimentes da canela com a tornozeleira toda queimada. Para não deixar dúvida quanto ao nível da (falta de) inteligência dessa figura estúpida, sua própria voz foi ouvida assumindo a culpa pela tentativa de violação, confessando à policial que havia criado aquele pregueado ao redor do aparelho quando realizou a “Operação Jerico” com um ferro de solda. Tamanha cagada de queimar as beiradas do equipamento foi “por curiosidade”, segundo balbuciou a própria anta. No meio daquele frisson, Closeau teve um dos seus lampejos brilhantes: “Bastava ter cortado a perna, montar numa muleta e entrar na História com a ‘Fuga Saci’”.
Defender essa criatura é tarefa facílima. Os advogados sabem que não vão precisar explicar nada sobre as derrotas jurídicas certas, porque o cliente não dá chance. Mas, ele (ou alguém) paga muito bem e isso é o que interessa no fim. Só fica difícil para os causídicos convencerem os juízes de que alguém que está sob efeito constante de medicamentos fortes consiga realizar algo assim sem queimar as próprias canelas. Diante do conjunto de tantas maluquices e até para o bem do preso, o Supremo achou prudente manter a prisão preventiva. Por unanimidade.
Viu-se que os petralhas eram fichinha na arte de construir patíbulos para uso próprio e restou um clima boquiaberto entre os aliados. Muitos começam a se perguntar como é que que um sujeito que vive de imagem pública insiste numa opção pra lá de temerária para o próprio futuro político.
Manter esse coquetel de desculpas esfarrapadas que mistura surto psicótico, confusão mental e efeito colateral de medicamentos potentes, inclusive psicotrópicos, significa adentrar um ambiente cercado de preconceito onde falta de lucidez e dependência grave a medicamentos pesados comprometem a credibilidade.
Nada mais mortal para quem se acha o cavalo do cão da direita. Não seria melhor os doutores emitirem logo um laudo comprovando que o distinto é, na verdade, vítima de idiotia (retardo mental grave)?
Diante do espetáculo deprimente, os amigos-ratos começaram a pular do navio do capitão. O rombo no casco é enorme e só ficaram os velhos gatos-pingados oportunistas de sempre. Já o rebanho encurralado, vive a dolorosa constatação de que Bolsonaro é um destrambelhado idoso, doente, condenado e preso, que diz ouvir vozes vindas de dentro da tornozeleira eletrônica que tentou violar de forma demente.
Os gaiatos de plantão já andam espalhando que o sujeito é tão fã de Lula que foi presidente, foi preso e agora quer ser metalúrgico. Também andam espalhando que a bichinha presa na canela, mesmo depois de tanto calor do ferro, disse “Tô contigo e não abro”.
Tudo que está acontecendo com Bolsonaro é de responsabilidade única e exclusiva dele mesmo, e esse tipo de trapalhão se torna tóxico quando ameaça o sistema. Por isso, nos ambientes íntimos da direita, já há um forte desejo de que Bolsonaro vire um problema exclusivo da Justiça, suma na poeira do esquecimento, leve os filhos junto e pare de atrapalhar a jornada do campo político, onde cada vez mais se forma um consenso de que essa família é uma fonte constante de estupidez e instabilidade.
Tanto que o Centrão já começou a negociar uma chapa presidencial sem ninguém do clã Buscapé. E como não tem bobo na trinca Valdemar-Ciro-Kassab, o enorme grupo que lideram tratou de espalhar que “o vídeo da tornozeleira inviabiliza anistia”. Até porque a insistência de tentar escapar pelo beco estreito da saúde mental gera imediatamente uma duvidazinha bem simples: se esse sujeito não responde por si, não tem mais condições de liderar absolutamente nada, muito menos exercer influência nas decisões do seu campo político numa sucessão presidencial.
Na verdade, a direita está tentando romper a própria tornozeleira eletrônica e se livrar dessa ligação cada vez mais indesejada. Pelo visto, chegou a hora do troco, de lançar o capitão gagá ao mar como ele fez com tantos aliados.
Na verdade, ninguém merece ficar aturando essa aporrinhação infindável.
O sujeito cometeu crimes e foi condenado? Que vá cumprir a pena que conquistou, o resto do país não pode ser penalizado junto. E chega dessa lenga-lenga de saúde frágil. Na hora da cana, esses patifes alegam que estão só vivos. Mas sempre prontos para subir em palanques, ocupar cargos e cometer crimes. Ora bolas!
Na verdade, o país vive as consequências da sua própria fragilidade. Enquanto continuarmos elegendo e reelegendo gente desqualificada, qualquer reclamação perde a legitimidade porque, a cada eleição, a chance de mudar é jogada na lixeira da cidadania.
Afinal, os eleitos apenas são quem são, uma maioria de prontuários ambulantes que escolhemos como representantes nos Executivos federal, estaduais e municipais, Congresso Nacional, assembleias legislativas e câmaras municipais. Sem contar as nomeações para tribunais superiores, cada vez mais infestados de representantes jurídicos de padrinhos políticos.
Essa estupidez que emerge das urnas e a conivência que nos flagela refletem a sociedade que somos, e garantem ao Brasil uma posição vergonhosa: quatro insignificantes que ocuparam a Presidência – Collor, Lula, Temer e Bolsonaro – foram parar no xilindró tratados com mesuras que nenhum criminoso comum merece. E Dilma escapou por um triz. É tão vergonhoso que até o Rio de Janeiro, alma mater do crime organizado nacional, já dá sinais de aborrecimento por ter ameaçada a liderança de prisões de chefes de Executivo com sua corja de governadores que puxaram cadeia.
Enquanto durar a polarização ao redor de figuras degradantes o Brasil não sairá desse atoleiro eterno. Também parece insustentável que um país com mais de 200 milhões de habitantes aceite bovinamente ser governado por presidentes eleitos com menos de 30% dos votos, verdadeira miséria estatística democrática que se perpetua por décadas. Um eleito nesse tipo de cenário deformado emerge das urnas sem representar nada além de uma minoria, e as consequências estão aí visíveis a olho nu.
O resultado dessa distorção é ter Lula e Bolsonaro se perpetuando em benefício próprio e de seus grupelhos, sem abrir espaço para qualquer tipo de renovação. São figuras desprezíveis que tomam microfones e privadas como sinônimos, e tratam o país como botequim de sua propriedade onde tudo é tocado com o elevado grau de imundície que carregam. Bem feito!
Enfim, chegamos à tal execução de pena tendo de aturar os jeitinhos brasileiros para vencer a dificuldade de punir. Os ilustres criminosos foram parar em quartéis, sala de estado-maior na PF e marmotas do gênero. E tudo indica que essas figuras que sujaram a farda manterão suas patentes militares.
Seguimos cheios de dedos para meter algemas em bandidos e mostrar imagens de suas prisões, que serviriam de bom exemplo para futuros criminosos. Insistimos em deixar esses patifes criarem suas verdades mentirosas para desmanchar suas mentiras verdadeiras. Falta culhão a esta eterna republiqueta de bananas.
A última do papagaio é a alegação de que o general de pijama Augusto Heleno sofre de demência. Ora, se essa figura enfrenta o alemão Alzheimer desde 2018, como é que foi ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República de 2019 a 2023? A resposta é simples: porque foi nomeado por outro demente, o do ferro de solda. O pior de tudo é que, quando a coisa ficou histriônica demais, a defesa tratou de enfiar o Exército no meio da polêmica alegando que a Força é que errou ao indicar 2018 como início da doença – baseado em declaração do próprio enfermo.
A única carta fora do baralho fardado foi Bolsonaro, largado à própria sorte – como fez com tantos aliados – quando o Exército deixou claro que não o quer em suas dependências durante o cumprimento da pena. Na verdade, a instituição reservou espaço apenas para os oficiais-generais condenados. Capitão não entra nesse clube fechado, ainda mais quando parece estar em fim de linha.
Cadê os doidos que iriam parar o país batendo continência a pneus, em transe com aquelas rezas enlouquecidas na chuva, com celulares na cabeça procurando ETs? Caíram na real e desistiram do papelão que protagonizaram naqueles acampamentos ridículos?
É saudável prestar atenção nos sinais do absoluto alheamento da caserna, que não emitiu sequer uma nota de duas cabeças (ativa e clubinhos da reserva) para protestar pelas prisões. É óbvio que as Forças Armadas não querem ser confundidas com os trapalhões da tropa.
Será que viramos a página e estamos num novo ciclo histórico? Pouco provável. Ainda vivemos divididos nos malditos rebanhos. Os militontos que cortaram os pulsos quando os petralhas foram engambelados, agora sentem orgasmos com a desgraça dos patriotários. E vice-versa. Nada mais bipolar! Sim, é verdade que a prisão levará o capitão ao ostracismo, inclusive por sua completa falta de brilhantismo. Mas há um rebanho órfão ansioso para conhecer seu novo capataz e ser tangido.
É sempre bom considerar que nesta republiqueta de bananas a casta política costuma se entregar a uma simbiose vergonhosa ao menor sinal de perigo, todos militando no mesmo lado para que o sistema de bons negócios não sofra solução de continuidade. E se livrando de quem botar a bunda (ou a canela) na janela.
É nestas horas que surgem projetos parlamentares sem qualquer interesse público como blindar e anistiar políticos, conter a atuação de instituições como Banco Central e Polícia Federal ou criar mecanismos para dificultar a punição de criminosos.
*Alisando Cresci não é jornalista. É especialista em mimimi de beiradas.